Wednesday, September 24, 2008

Geração Magalhães

magalhaes
Normalmente, evitaria escrever aqui sobre temas em que estou envolvido profissionalmente. Neste caso, não posso resistir. Desde que o Magalhães foi lançado no fim de Julho, já se escreveram muitos disparates sobre o assunto, mas ontem atingiu-se o pico. Depois de ver as respostas contra a maré do Marco, do Pedro e do Paulo Querido, sinto-me na obrigação de partlhar a minha parte da história.

Há dois anos, Portugal estava claramente dividido ao meio no acesso a computadores e Internet: metade das famílias tinham computador e banda larga, mas a outra metade estava excluída. Foi essa a razão que levou o Governo a avançar com o e-escola porque era claro que o mercado, só por si, não estava a conseguir quebrar essa barreira. Mas não foi fácil desenvolver o e-escola... Durante seis meses foi preciso ultrapassar dúvidas legítimas, montar uma logística complexa e ganhar o entusiasmo de operadores móveis, de fornecedores de hardware e software e das instituições públicas envolvidas em três ministérios diferentes.

Um ano depois, o sucesso do e-escola (já estão mais de 250.000 portáteis entregues a professores, alunos e adultos em formação) demonstrou que Portugal era um parceiro de confiança para iniciativas com esta ambição. Foi isso que criou a oportunidade para o Magalhães e o e-escolinha aparecerem. A Intel, que foi um dos parceiros do e-escola, ofereceu a sua plataforma Classmate como base para atingir o público mais novo. É preciso explicar que o Classmate da Intel não é um modelo de computador, é uma plataforma base sobre a qual os fabricantes podem construir o seu produto, com a sua marca. É por isso que não se encontram “Classmates” à venda, mas sim portáteis 2go e, agora, Magalhães.

Ao longo de meses, definiram-se requisitos para criar o Magalhães, com especificações próprias e, mais importante, garantindo que seria fabricado em Portugal. Não é indiferente importar um produto fabricado na China (como o OLPC) ou criar condições para um consórcio de empresas portuguesas fabricar a máquina cá, incorporando cada vez mais componentes fabricados também em Portugal. É por isso que em vez de se criar uma “simples” fábrica OEM, o Magalhães permitiu que fosse instalado em Portugal o primeiro ODM na Europa. Com o Magalhães, para além da concretização de um programa útil ao país, ganha-se escala para se poder exportar, como o exemplo da venda à Venezuela comprova.

O Magalhães vale mais do que a polémica estéril sobre se era “português”, se era o primeiro ou se tinha os filtros de conteúdo activos - não há programa que substitua o “controlo parental” dos próprios pais! O Magalhães vale pelo brilho que vi ontem nos olhos das crianças que o receberam em Mafra e vale pela oportunidade de acreditarmos e construirmos algo novo em vez de continuarmos a fazer a “autópsia” do que falhou. Vale sobretudo porque coloca o computador e a Internet ao alcance de todas as crianças, e não apenas daqueles que podem pagar os preços de mercado.

Com o e-escola e o e-escolinha, todos os alunos entre os 6 e os 18 anos passaram a ter ao seu alcance um computador com ligação. Estamos a falar, incluindo professores, de 1 milhão e meio de portugueses, cerca de 15% da população. Não há memória de um investimento desta ordem nem há nenhum País que tenha feito nada parecido. É por isso que o que está em causa é investir na nova geração de portugueses para lhes dar as oportunidades que faltaram às anteriores. Penso que foi por essa razão que o Leonel Moura lhes chamou no início de Agosto, numa crónica no Jornal de Negócios, “Geração Magalhães”.

2 comments:

Rui Grilo said...

cheguei aqui pelo blog do senhor marketing.
gostei bastante deste post, porque me clarificou algumas coisas que tinham sido "poluidas" pelos media.
comento apenas para deixar um link sobre a minha 1a opini�o em rela��o ao computador.
joao lagido | Homepage | 27.09.08 - 4:25 pm | #
Comentários importados do Haloscan:

Saudo o autor deste post, pela lucidez da analise que faz e pelo orgulho que denota na iniciativa "Magalhaes". O seu post foi extremamente esclarecedor, e deita por terra muita maledicencia que foi por ai sendo feita nos ultimos tempos. A iniciativa "Magalhaes" foi algo de muito positivo para o pais e devemos orgulhar-nos dela. Ja basta de Velhos do Restelo que muito criticam mas nada fazem pelo Pais onde vivem. Como "net evangelist" que hoje sou, nao poderia estar mais satisfeito. Tambem sou um "talent evangelist", e estou muito optimista exactamente pelas mesmas razoes. Acredito que ainda ha muito a fazer, mas tambem acredito no "efeito de contagio" que iniciativas positivas como esta podem gerar na mudanca de habitos e mentalidades. Estou certo que uma geracao "ligada" sera certamente uma geracao onde o talento tem melhores condicoes para se desenvolver. Um grande bem-haja por ter a coragem de nao ir atras da moda de dizer mal de tudo o que se faz no pais. O comentario segue sem acentuacao pois caso contrario a formatacao perde-se. Desculpem assim a falta de rigor gramatical, mas acreditem que a culpa nao e do Magalhaes
Ricardo Fortes da Costa | Homepage | 01.10.08 - 7:12 pm | #

E para quando a inclusão dos manuais escolares em formato pdf no Magalhães? Poupava-se no peso que os miudos têm de transportar de e para a escola, nos custos de produção dos manuais, nos tempos de distribuição, nas arvores que são abatidas, e já agora nas carteiras dos pais.
Rui Silva | 03.10.08 - 10:29 am | #

boas,

não teria sido possível fazer o mesmo com o OLPC que é uma plataforma bem mais interessante de desenvolvimento?

ainda hoje eu e muitos mais portugueses desconhecem a engenharia financeira que permite o classmate português.
ainda hoje desconhe ço os valores que das licenças de software da microsoft, e quem paga a diferença entre custo real do classmate e o custo final para os alunos.

muitas quest ões mais poderiam ser colocadas mas estas deveriam ser respondidas preto no branco.

rjnunes
ricardo nunes | Homepage | 03.10.08 - 11:52 pm | #

Caro Ricardo Fortes da Costa,

Agrade ço o comentário e o problema dos acentos já está resolvido (precisava de ajustar o conjunto de caracteres no HaloScan).

Gostei de visitar o seu blog (http://mentesbrilhantes.wordpress.com/) e agrade ço-lhe a referência no post sobre o Magalhães.
Rui Grilo | Homepage | 08.10.08 - 2:38 pm | #

Caro Rui Silva,

Parece-me inevit ável que se caminhe nesse sentido, desmaterializando gradualmente os livros. Mas mais do que replicar o papel em PDFs, talvez fosse mais interessante aproveitar a interactividade que o suporte digital permite e juntar conteúdos locais com a interacção na net. Penso que as mudanças educativas ainda estão muito no início...
Rui Grilo | Homepage | 08.10.08 - 2:38 pm | #

Caro Ricardo Nunes,

Sobre o OLPC, que é um projecto pioneiro e de grande mérito, deixe-me citar o Portugal Diário:

"Algo que poder á ter pesado na escolha portuguesa é a produção do computador em solo nacional. «A OLPC não deixa dúvidas. Só constrói na China, para que o processo seja sistematizado e garantido o preço do computador», lembra Wayan Vota."

Sobre a arquitectura do programa, segue o modelo adoptado no programa "e-escola", lançado no ano passado.

Uma componente interessante do Magalh ães enquanto plataforma, que tem passado despercebida, é a ligação à comunidade open source nacional envolvendo, por exemplo, a distribuição de Linux da Caixa Mágica e o OpenOffice.org.
Rui Grilo | Homepage | 08.10.08 - 2:53 pm | #

boas,

Rui, permita-me dois pontos:

1 º ainda hoje não sei como o classmate pt é financiado, como tal e presumindo que todos estamos a pagar por ele, acredito que o governo português conseguiria trazer para cá parte da produção do olpc, ainda para mais que só a encomenda da venezuela creio que é maior que todos os olpcs ate agora produzidos.

2 º a caixa magica só tem sido usada como veículo de propaganda governamental, em lado nenhum se vê falar dela e quando se vê nunca ninguém sae do que está a falar, apenas debitam as palavras linux e que tem o openoffice, como seo sistema operativo fosse o conjunto dessas duas ferramentas.

para al ém disso pergunto, não seria mais lógico usar o openoffice em ambas as partições, em ms-windows e em linux CM, uma vez que usa formatos padronizados internacionalmente como o ODF, ao contrário do ms-office no classmate magalhãses que usa o formato *.doc que é proprietário e que não pode ser implementado a 100% por outras empresas e software livre, apesar do openoffice o tentar?

ou mais uma vez o governo portugu ês e as pessoas que decidem, para além de não saberem do que falam e do que aprovam, usam mais uma vez a palavra Interoperabilidade como propaganda, não a subscrevendo e usando na realidade?
ser á que as palavras da comissária europeia que recomenda o uso de padrões abertos e que afirma "«Nenhum cidadão ou companhia deveria ser forçado ou encorajado a escolher uma tecnologia fechada contra uma aberta, graças a um governo ter feito essa escolha primeiro», diz Neelie Kroes, bem como «Escolher formatos tecnológicos que podem ser utilizados por fornecedores diferentes — frequentemente sem pagar taxas — é uma decisão de negócio muito esperta»."

não deverá ser levado em conta?

rjnunes
ricardo nunes | Homepage | 09.10.08 - 11:16 am | #

Rui, 100% consigo, como pode ver aqui:
http://techhoje.blogspot.com/2008/10/steve-balmer-o-plano-tencolgico-portugu_3686.html
António Eduardo Marques | Homepage | 26.10.08 - 9:42 pm | #

Belinha Fernandes said...

Olá!Cheguei aqui via seu Follow do Twitter.Embora não tenha formação tecnológica sigo a evolução e estou muito ligada à utilização da internet e alerta para suas potencialidades.Gostei do post e dos comments.Deve estar a par do projecto de Negroponte,também ele foi sobejamente criticado por querer entregar um portátil a crianças que nada tinham,nem luz eléctrica.O que me preocupa nessa questão toda do Magalhães é a utilização efectiva do objecto como recurso educativo...pois usá-lo para brincar é muito fácil.Se foi o primeiro português ou não,isso não interessa nada,escrevo num portátil que foi assemblado aqui em Portugal e já o tenho desde 2004.Nos comments fala-se do software usado e isso é outra questão importante.Mas fico por aqui porque não sou expert no assunto.Obrigada pelo Follow no Tt!